Compartilhando impressões sobre o Espetáculo "Os Cactos".

Compartilhando impressões sobre o Espetáculo "Os Cactos".


“A análise do espetáculo se atribui uma tarefa desmedida que ultrapassa talvez as competências de uma só pessoa. De fato, é preciso que ela leve em consideração a complexidade e a multiplicidade dos tipos de espetáculos, recorra a uma série de métodos mais ou menos comprovados, ou mesmo invente as metodologias mais adaptadas a seu projeto e seu objeto.”
Pavis, Patrice, 1947 – A Análise dos Espetáculos

Invoco a colocação de Patrice Pavis como forma de auto-provocação. O que segue é apenas uma tentativa despretensiosa de expor minhas impressões referentes à remontagem do espetáculo Os Cactos do grupo que faço parte, o Expressões Humanas.
Tentarei fugir às demasiadas subjetividades tão comuns nos recentes comentários sobre espetáculos, de modo que reduzirei-me a pontuar percepções estéticas e conceituais.

OS CACTOS - À eles, que a morte não matou.

“Narra a história de uma mãe que se confina no quarto do filho desaparecido na ditadura militar brasileira. O jovem foi preso e torturado, depois do quê, desapareceu sem deixar pistas.

O decorrer da trama cuida em mostrar o legado dessa ditadura nas relações humanas até os dias de hoje. O espetáculo, portanto, está intimamente ligado ao presente: os desaparecidos políticos no Brasil ainda somam mais de 140 entes queridos cujos familiares não tiveram o direito de enterrar.”

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Sobre o conceito:
Primeiramente é primordial falar da temática. Faz parte do histórico do grupo tratar de questões sociais. Isso é reflexo do nosso modo de encarar o mundo e arte. Não trata-se simplesmente de falar de uma fato histórico, é um resgate no sentido primário do termo – trazer novamente. A ditadura é exposta na atualidade e dialoga com ela. Há também um caráter de denúncia.

Outro fator importante é o recorte da família, ali não tratada apenas como uma família que de modo isolado vivenciou um período, mas simbolicamente representando todos os atingidos pelo fato, tornando presente o arquétipo, o mito, essenciais para o ritual.

Sobre a estética:
Enquanto estética, as opções do espetáculo são claras. Brecht está presente, pautado principalmente na relação com o público e na “mensagem social' de que trata a peça.
A participação do espectador no espetáculo, segurando o tecido preto que delimita o espaço da sala de tortura, impõe uma postura ativa, mesmo quando a atitude é de recusar-se à ação proposta. A parede, símbolo da delimitação, do limite e da barreira, representa tanto o sentimento de impotência do espectador quanto sua conivência frente à tortura. Por outro lado, quem opta por não segurar o tecido, acaba impedido de ver a cena, aguçando a audição e potencializando sua capacidade imaginativa.
A música, feita na cena pelos atores, uni-se aos outros elementos (cenário, luz e figurino) para compor a poética, pensada funcionalmente, dispensada sempre que possível, priorizando o ator como epicentro da construção poética.
João Paulo Pinho

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